Neste domingo de Páscoa é oportuno recordar a natureza da obra expiatória de Cristo e o seu impacto em nossas vidas. Falar da obra de Cristo é falar de sua encarnação, sofrimento, morte e ressurreição.
Conforme Colossenses 1.19 e 20, “aprouve a Deus que, nele, residisse toda a plenitude e que, havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus”. Tal obra foi executada de forma perfeita, eficaz e definitiva, constituindo-se no tema central das Escrituras Sagradas.
A obra de Cristo deve ser conhecida e assimilada, pois é ela que possibilita o reencontro do homem com Deus e a harmonia plena entre o Criador e o mundo criado.
Em Colossenses 1.13 a 23, Paulo trata deste tema especial que é a obra definitiva de Cristo. Na sociedade colossense havia uma forte corrente filosófica, denominada gnosticismo – “Os gnósticos acreditavam que os seus devotos adquiriam um tipo especial de iluminação espiritual, alcançando por ela um nível secreto ou mais elevado de conhecimento não acessível aos não iniciados. Os gnósticos também tinham a tendência de realçar a esfera espiritual em detrimento da material, muitas vezes afirmando que esta é má e por isso deve ser evitada” (Dicionário de Teologia, Vida).
Ao apresentar de forma clara e aberta a obra de Cristo como caminho para a salvação do homem, Paulo confronta a doutrina gnóstica, calcada no mistério, em fundamentos filosóficos e no esforço humano.
Por constituir o cerne do evangelho, a obra de Cristo deve ser conhecida e considerada com toda a atenção. Vejamos então:
A obra de Cristo é uma obra de redenção
Em Colossenses 1.13 e 14, o apóstolo Paulo afirma que Cristo “nos libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do seu amor, no qual temos a redenção, a remissão dos pecados”. Conforme notas da Bíblia de Estudo de Genebra, “esta linguagem lembra a libertação de Israel da escravidão do Egito primeiro e, depois, do cativeiro da Babilônia. Paulo contempla a humanidade fora de Cristo como estando irremediavelmente sob o ‘poder das trevas’, o governo maligno de Satanás (cf. Ef 2.1-3; 6.11). Os crentes são resgatados deste estado universal (Gl 1.4) e trazidos para permanecer sob o domínio e a proteção do Filho de Deus”.
A obra de Cristo é uma obra de libertação que redime o homem da servidão das trevas e do pecado, elevando-o à condição de cidadão livre. Por meio dessa obra, o redimido é inserindo em um reino muito especial: um reino de luz, o reino de Deus.
Fica evidente, na declaração paulina, que a obra da redenção é realizada por Cristo. Ele liberta, transporta e redime. É importante observar que a obra de Cristo não apenas nos transporta de um lugar para outro, isto é, das trevas para a luz, mas, sobretudo, liberta da escravidão exercida pelo pecado.
O apóstolo enfatiza a obra redentora como sendo obra de Cristo, pois, como já foi dito no início, entre os colossenses era comum o conceito gnóstico da redenção adquirida mediante ritos secretos de iniciação, fórmulas místicas e práticas ascéticas. O texto bíblico declara explicitamente que a redenção não é obra do próprio homem, mas de Cristo.
A obra de Cristo é a essência do plano divino
Em Colossenses 1.15 a 20, Paulo apresenta um hino cristológico para falar da centralidade da obra de Cristo. Percebe-se claramente nesse hino que o clímax é a cruz. A esse respeito, afirma Ralph P. Martin: “Acima de tudo, colocou a ‘teologia da cruz’ no ponto crucial do hino, e transformou um hino de louvor ao Senhor cósmico da criação num cântico de redenção que se centraliza na expiação feita por Cristo como Salvador da Igreja” (Colossenses e Filemon – Introdução e Comentário, Mundo Cristão/Vida Nova).
Com a frase: “aprouve a Deus que, nele, residisse toda a plenitude”, Paulo mostra que a obra de Cristo é, de fato, a essência do plano divino.
A obra de Cristo deve ser abraçada e usufruída com fé e santidade
A compreensão acerca do significado da obra de Cristo exige de cada um de nós uma atitude: “E a vós outros também que, outrora, éreis estranhos e inimigos no entendimento pelas vossas obras malignas, agora, porém, vos reconciliou no corpo da sua carne, mediante a sua morte, para apresentar-vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis, se é que permaneceis na fé, alicerçados e firmes, não vos deixando afastar da esperança do evangelho que ouvistes e que foi pregado a toda criatura debaixo do céu, e do qual eu, Paulo, me tornei ministro” (Cl 1.21-23).
A experiência da fé, que nos habilita a reconhecer a obra de Cristo, nos chama a uma vida de santidade: “para apresentar-vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis” (Cl 1.22). Não podemos, portanto, ficar indiferentes à obra de Cristo. Todos os que já foram iluminados pelo Espírito discernem o significado da obra de Cristo e permanecem na fé, alicerçados e firmes, sem jamais se afastar da esperança do evangelho. Tal convicção é traduzida em vida de santidade.
A obra de Cristo não pode ser desprezada, não pode ser negligenciada. A propósito, o autor da Carta aos Hebreus faz uma oportuna advertência: “Por esta razão, importa que nos apeguemos, com mais firmeza, às verdades ouvidas, para que delas jamais nos desviemos. Se, pois, se tornou firme a palavra falada por meio de anjos, e toda transgressão ou desobediência recebeu justo castigo, como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação”? (Hb 2.1-3).
Conclui-se, portanto, que a obra de Cristo não é simplesmente um fato histórico a ser reconhecido e comemorado, nem meramente um conceito teológico a ser compreendido e defendido. Na verdade, a obra de Cristo interfere diretamente em nosso viver, transformando-nos para a experiência de uma nova vida: a vida de fé e santidade.
Conforme comentário da Bíblia de Estudo de Genebra, “a fé salvífica é fé perseverante e paciente (v.11), ancorada na esperança (v.5) (…) Fé e esperança verdadeiras estão somente em Cristo e em nenhum outro lugar. Esse relacionamento com Cristo é confirmado pela fé e esperança, não por disciplinas ascéticas rigorosas”.
Diante da obra definitiva de Cristo, apresentada no evangelho, não podemos adotar conceitos filosóficos deturpados e equivocados nem assumir uma postura de negligência, mostrando-nos indiferentes: “Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor” (Hb 12.28).
Cristo nos redimiu para uma nova vida e uma viva esperança! A sua obra é definitiva, não precisa ser repetida nem complementada e não tem como ser desfeita! A obra perfeita de Cristo deve ser abraçada e usufruída com fé e santidade.
Pr. Eneziel P. Andrade
eneziel@hotmail.com